quarta-feira, 30 de julho de 2008

Caminhos da infância

Avançando na superação da barbárie

A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara aprovou, em 09/07, projeto que proíbe qualquer tipo de publicidade dirigida a menores de 12 anos e restringe aquelas destinadas ao público adolescente. A proposta segue agora para a Comissão de Constituição e Justiça e, se aprovada, passará por avaliação do Senado.

O projeto, do deputado tucano Luiz Carlos Hauly, proíbe uso de linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores, trilhas sonoras de músicas infantis, celebridades com apelo entre o público infantil e promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis. O texto também proíbe qualquer tipo de publicidade, 15 minutos antes ou depois de programação infantil e veda a participação de crianças nas ações publicitárias.

A proposta restringe veiculação de "merchandising" em programa de entretenimento para adolescente e proíbe a indução, "mesmo implicitamente, de sentimento de inferioridade no adolescente, caso este não consuma determinado produto ou serviço" e o uso das palavras "somente" e "apenas" junto aos preços dos produtos e serviços. Prevê multas de 1 mil a 3 milhões de Ufirs em caso de infração.

A regulamentação proposta não é novidade em países da Europa e visa eliminar mensagens que não tenham outras preocupações senão com o consumo. Trata-se de um passo importante na conquista do direito à comunicação. E não fere a liberdade de expressão como costumam distorcer os mercadores da propaganda que estimula o consumismo infantil em países periféricos. Mais: o projeto traz um importante debate sobre as crianças que queremos formar. Elas têm o direito a “zonas protegidas”, porque ainda não sabem se defender das pressões comerciais.

infância estamos construindo?

Ano passado, a mestra em Psicologia Clínica Lais Fontenelle Pereira escreveu para a Folha de S Paulo um texto com título acima. E a seguinte introdução: O 12 de outubro é Dia das Crianças, mas a que preço? O que de fato celebramos nessa data: a criança ou o consumo?

"NÃO ESQUEÇA a minha Caloi". "Compre Batom". "Danoninho vale mais do que um bifinho"... Para Lais, não é de hoje que os apelos publicitários interferem na formação de nossos filhos. As crianças trocando parques e colos por shoppings ou telas, imersas em imagens e sons que nos atravessam sem nos pedir permissão. “A palavra, substituída pela imagem... A atenção, pelo presente... O abraço, pelo objeto... E a criança, pelo consumidor... O ter prevalece sobre o ser”.

O valor gasto no Brasil em publicidade dirigida ao público infantil de R$ 210 milhões (Ibope) contrasta com o valor do investimento no Programa Federal de Desenvolvimento da Educação Infantil (FNDE), de R$ 28 milhões. A publicidade participa da formação de nossas crianças tanto quanto a escola. O que é mais importante: os objetos que prometem a felicidade ou a educação?

As imagens publicitárias dirigem-se às crianças, o que é extremamente abusivo, pois até 12 anos elas não têm capacidade crítica de entender o caráter persuasivo das mensagens. Até quatro anos as crianças não conseguem diferenciar publicidade de programas. (...) Os pais foram substituídos pela mídia no papel de transmitir os caminhos da infância. Porém, o mercado assumiu isso pensando no lucro imediato, e não nas crianças ou no futuro da nação.

A natureza não é muda

Fragmento de A natureza não é muda, texto do poeta Eduardo Galeano, publicado no semanário Brecha, do Uruguai, e reproduzida por
Carta Capital, em 23/04/2008:

“O mundo pinta naturezas mortas, sucumbem os bosques naturais, derretem os pólos, o ar torna-se irrespirável e a água imprestável, plastificam-se as flores e a comida, e o céu e a terra ficam completamente loucos. E, enquanto tudo isto acontece, um país latino-americano, o Equador, está discutindo uma nova Constituição. Nela, a possibilidade de se reconhecer, pela primeira vez na história universal, os direitos da natureza”.

“A natureza tem muito a dizer, e já vai sendo hora de que nós, seus filhos, paremos de nos fingir de surdos. E talvez até Deus escute o chamado que soa saindo deste país andino, e acrescente o décimo primeiro mandamento, que ele esqueceu nas instruções que nos deu lá do monte Sinai: ‘Amarás a natureza, da qual fazes parte’” (...)

Dia 3 de julho, em Montevidéu, Galeano foi declarado o primeiro Cidadão Ilustre do Mercosul, por sua contribuição "à cultura, à identidade latino-americana e à integração regional". A homenagem, justa, reuniu personalidades da cultura e da política latino-americana.

No evento, Galeano defendeu a unidade dos povos latino-americanos: "... só existindo juntos, seremos capazes de descobrir o que podemos ser, contra uma tradição que nos treinou para o medo, a resignação e a solidão e que a cada dia nos ensina a não gostarmos de nós mesmos, a cuspirmos no espelho, a copiar ao invés de criar".

terça-feira, 22 de julho de 2008

Ingerências

EUA querem influenciar a reforma política do Brasil

A Folha de S. Paulo revelou nesta terça-feira que em 2005 a United States Agency for International Development (USAID), agência estadunidense ligada ao Departamento de Estado, promoveu no Congresso brasileiro um seminário sobre a reforma política brasileira, com a presença de palestrantes estrangeiros. O objetivo, segundo documentos passados à Folha era fazer o seminário coincidir com a véspera da discussão do tema no Legislativo brasileiro e um ano antes da reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva. O evento foi realizado graças a uma parceria com a Universidade Candido Mendes, do Rio de Janeiro.

Dois pontos pareciam preocupar mais os proponentes do seminário: a profusão de partidos pequenos e a infidelidade partidária, que avaliavam ocorrer com mais freqüência nos partidos de direita. E uma providência: “A cobertura máxima da imprensa, com o objetivo de instruir a imprensa política sobre as questões”. O sucesso do programa seria avaliado por sua "influência no debate nacional". Um cuidado: a "nacionalização" da conferência, para que não seja vista como divulgadora da perspectiva dos EUA. "Devido à sensibilidade da questão", cuidavam-se.

Seminários, como este, são desenvolvidos mundo afora, “para ajudar países a desenvolver seus processos democráticos” e a verba provém principalmente da USAID e do National Endowment for Democracy (NED). Na realidade, buscam interferir na situação política local para beneficiar os projetos expansionistas de Washington. Esse mesmo tipo de ação foi acusado de fortalecer os grupos que derrubaram o então presidente do Haiti, Jean-Bertrand Aristide, em 2004. E de apoiar o golpe frustrado que tirou do poder o venezuelano Hugo Chávez por algumas horas em 2002.

USAID, velha conhecida do movimento estudantil no Brasil

A USAID foi recentemente escorraçada da Bolívia por financiar os grupos separatistas contra o governo Evo Morales. Por sua vez, o NED exerce importante papel no financiamento do grupo do dalai-lama e de outras organizações tibetanas no exílio. É também importante base de apoio financeiro, em diferentes regiões do planeta, ao grupo Repórteres Sem Fronteiras (RSF). Ambos os programas, conforme escreveu o jornalista estadunidense Jeremy Bigwood, participam do financiamento secreto “de meios informativos e jornalistas estrangeiros”, em mais de 70 países.

Segundo o jornalista brasileiro Mário Augusto Jacobskind, a revista In These Times descobriu que os referidos programas mantêm centenas de organizações não governamentais estrangeiras, jornalistas, políticos, associações de jornalistas, meios de notícias, institutos de melhoramento de jornalistas e faculdades de jornalismo. O Centro para a Ajuda Internacional dos Meios de Comunicação (CIMA), uma repartição do Departamento de Estado financiada pelo NED distribuiu, via USAID, quase 53 milhões de dólares para os meios de comunicação estrangeiros.

O Convênio MEC-USAID, assinado com a ditadura militar brasileira, tinha como objetivo adequar a política educacional brasileira ao figurino de desenvolvimento econômico elaborado por Washington. A luta contra o famigerado convênio foi importante instrumento de ampliação e de unidade do movimento estudantil, transformado em principal força de resistência à ditadura militar.

Um espectro ronda a liberdade de expressão na Internet

A rede internacional de computadores está entre os diferentes instrumentos de interferência estadunidense fora do seu território. Dados divulgados em março deste ano pelo jornal cubano Juventud Rebelde revelam que o governo dos EUA mantém uma "lista negra" que incluiu páginas de Internet de 557 empresas cubanas ou internacionais com vínculos comerciais com Cuba.

Um total de 3.719 domínios com “extensão .COM” são bloqueados por ordem da OFAC, órgão do Tesouro estadunidense, sem a mínima notificação prévia aos seus donos. O diário cubano cita informações do The New York Times, segundo o qual alguns dos "sites, em inglês, francês e espanhol, funcionavam desde 1998".

Alguns, como www.cuba-hemingway.com, eram literários. Outros, como www.cuba-havanacity.com, tratavam temas da história e cultura de Cuba. Como www.ciaocuba.com e www.bonjourcuba.com, que eram meros sites comerciais dirigidos a turistas italianos e franceses. Juventud Rebelde apresentou uma longa lista com os nomes da cada um dos sites bloqueados pela OFAC. Entre estes, de países como o Canadá, Espanha, França, México, Brasil, Itália e Japão.

Que temos com isso? Nada, não somos cubanos. Como no poema de Maiakowsky: “Na primeira noite... Eles colhem uma flor...” São “apenas” ações de censura. A ponta do iceberg de uma agressão de maior alcance, e não somente contra Cuba, que atinge a rede mundial da Internet.
O próprio The New York Times qualificou de "escandalosa" a decisão de aplicar, para qualquer país, sanções cujas legalidades não se sustentam nem sequer no próprio território dos Estados Unidos.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Contribuições a uma folha corrida

Por Luc Levi, publicada no Vermelho
Ministro fanfarrão

Em 28/04/2008, o Boletim H S Liberal postava, sob o título acima, o seguinte texto referente ao fanfarronesco discurso de posse de Gilmar Mendes:

“A concorrida posse do novo presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, foi uma festa para a mídia e para as oposições que enxergaram em seu discurso um puxão de orelha no governo e a abertura de uma nova trincheira contra o presidente Lula. A mesma mídia e a oposição, que por vezes se confundem, fazem de conta que a fanfarronice do ministro é uma vestalina preocupação de um novo herói que desembarca na corte para cuidar bem da coisa pública”.

“A identidade da fala novo presidente com a mídia começa com a criminalização dos movimentos sociais, com ênfase para o MST e respingo nos estudantes de São Paulo e de Brasília. Com a oposição, uma identidade mais antiga. (...) o ministro-presidente serviu com desvelo na Advocacia Geral da União do governo tucano e, por isso, foi elevado à categoria de ministro. Não consta que, como membro do governo FHC, o novo “paladino” da República tenha feito o menor esforço contra o excesso de medidas provisórias que somente agora (...) vê imobilizar o legislativo”.

“(...) Acusado de participar das famosas “blindagens” durante o governo FHC, o ministro causou grande polêmica no Supremo com procuradores da República quando da sua intervenção em defesa de seus ex-colegas do governo, o ministro Raul Jungmann e outros, (...) por lesão ao patrimônio público e à probidade administrativa. Na pauta imediata do Supremo, agora sob presidência correligionária tucana, serão julgadas matérias de interesse político do PSDB contra o governo Lula. O próprio ministro é relator”.

Antecedentes

Em 08 de maio de 2002, o jurista Dalmo Dallari escreveu para a Folha de S. Paulo um atualíssimo texto sobre a degradação do judiciário. Com Gilmar Mendes na berlinda.

O professor denunciava o presidente FHC que, “com afoiteza e imprudência muito estranhas, encaminhou ao Senado uma indicação para membro do Supremo Tribunal Federal (que é uma) verdadeira declaração de guerra do Poder Executivo ao Poder Judiciário e a toda a comunidade jurídica”. E, premonitório: “não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a normalidade constitucional”

Dallari diz que a indicação de Gilmar Mendes, alto funcionário da Presidência, para a Suprema Corte seria o indício de que “estaria sendo montada uma grande operação para anular o STF, tornando-o completamente submisso ao chefe do Executivo, mesmo depois do término de seu mandato”. E “o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários”

Segue o professor Dalmo: Gilmar era especialista em "inventar" soluções jurídicas no interesse do governo. Embora pertencendo ao Ministério Público da União, Gilmar “vê” inconstitucional as demarcações de terras indígenas, duas vezes negado pelo STF. Mesmo assim, a tese serviu para um decreto de FHC revogando as demarcações. Gilmar costumava, quando derrotado no judiciário, recomendar aos órgãos do governo para não cumprir as decisões judiciais.

O atual presidente do STF sempre se mostrou grosseiro, de público, com juizes e tribunais que emitiam decisões contrárias ao governo. Dizia que toda liminar concedida contra ato do executivo federal é produto de conluio corrupto entre advogados e juízes, sócios na "indústria de liminares". Há também problema ético: Gilmar Mendes pagou R$ 32.400,00 a um instituto, do qual é um dos proprietários, para ministrar cursos a servidores do órgão que presidia.

Um santo nome

Hoje, os membros do Ministério Público Federal e os Procuradores da República reafirmam que “as instituições democráticas brasileiras foram frontalmente atingidas pelas decisões liminares proferidas, em tempo recorde, pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, em flagrante supressão de instâncias, bem como pela inaceitável remessa de decisões judiciais para órgãos administrativos disciplinares, impondo grave risco à independência funcional de Magistrado Federal".

Para confundir o ouvinte, leitor e espectador, a maior parte da imprensa vem manipulando as informações. Entretanto, o site Terra Magazine, que tem feito uma ampla cobertura do episódio, revelou, ontem, com exclusividade, provas de que as relações promíscuas de Dantas com o tucanato atingem a mais alta plumagem: uma gravação feita pela Polícia Federal no bojo da Operação Satiagraha mostra diálogos que envolvem o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nas negociatas do banqueiro.

Não é sem razão que não se vê reclamações sobre o uso de algemas nas prisões efetuadas pela PF senão nas hostes do demo-tucanato envolvidas com o banqueiro aloprado. Na realidade, a reclamação é contra a prisão em si. Por outro lado, não é sem razão que as atividades do Opportunity Fund, o principal instrumento de manobra de Daniel Dantas, era dirigido pelo próprio Daniel, por Verônica Dantas e pelo recém ex-presidente do Banco Central do governo FHC, Pérsio Arida. Um alto escalão de governo tucano. Como Gilmar Mendes.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Download da Biografia Não Autorizada de Uribe

Clique na capa para o download.

Um cavalo selado para Ingrid


Um cavalo selado para Ingrid.

Ingrid Betancourt, a ex-refém das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), disse à Rádio França Internacional, nesta segunda-feira, que não é só a guerrilha que deve se "retificar", mas também o presidente colombiano e a "Colômbia inteira" devem mudar o que chamou de "vocabulário radical, extremista e de ódio". Segundo a
agência EFE, ela pediu ao presidente que dê, "ao outro, espaço de respeito e tolerância...” E se Uribe não se convencer, ela diz que insistirá "até que o povo reaja”.

Ingrid Betancourt foi seqüestrada antes da eleição presidencial de 2002, em que foi candidata contra Uribe. Vitorioso, Uribe foi reeleito em 2006, depois de emendar a constituição colombiana. Agora, com a popularidade em alta, busca outro artifício para um terceiro mandato. Pesquisa da imprensa colombiana mostra que, excetuando o próprio Uribe, a ex-refém das FARC lidera a corrida presidencial.

Segundo a
agência Reuters, Betancourt disse que ainda é cedo para dizer se voltará à vida política, mas que pode “tentar encontrar um papel diferente na Colômbia”. "Não estou dizendo que não vá me candidatar à Presidência. Talvez, algum dia. Ou talvez não. Quero dizer que não é essa minha ambição. Minha ambição é servir. Servir a meu povo, a meu país." Ou seja: candidatíssima.

Diferentemente das condições favoráveis de hoje, em 2002 Ingrid amargava menos de um por cento das intenções de voto. Fato que, para alguns, teria motivado sua aventura pelos arriscados domínios territoriais das FARC e o inevitável seqüestro. A longa carona forçada ensinou à ex-candidata que seu país não resolveu as questões sociais que permitiram a existência da mais antiga oposição guerrilheira de todo o mundo.

Hoje, turbinada pelos fatos recentes, já puxa a orelha de Uribe, como destaca o diário argentino
Página/12, desta terça-feira: “Ingrid disse que sua diferença com o presidente colombiano é que ‘ele crê que se chega à paz terminando com as FARC e eu creio que há que se fazer mudanças sociais”. Resta a ela provar que não é igual a Uribe, uma difícil tarefa em face do seus antecedentes políticos e do seu pai, legítimos representantes da oligarquia colombiana e serviçais de governos discricionários. Mesmo assim, o cavalo passa generosamente selado. E Ingrid parece querer cavalgá-lo.

Muitos são os problemas do presidente da Colômbia.

Ingrid é o ovo da serpente recém chocado que já começa a perturbar o sonho de Álvaro Uribe Vélez por um terceiro mandato. Ao lado de paradoxal popularidade, o presidente enfrenta a maior crise institucional do seu governo. O suficiente para haver concentrado energias no episódio da libertação de Ingrid Betancourt. Há fortes indícios de golpe na fase final de um acerto combinado entre as FARC e uma comissão internacional multilateral, conforme revelou uma rádio estatal da Suíça francesa.

Reforça a suspeita o fato de a senadora colombiana Piedad Cordoba, quatro semanas antes da libertação de Ingrid, haver revelado que o governo da Colômbia estava negociando um acordo com as FARC para trocar dinheiro pela liberdade de Betancourt e dos mercenários dos EUA. Mas, a crise institucional é muito mais que isso.

Uribe vem navegando em mar revolto desde que Joseph Contreras, jornalista e correspondente da revista Newsweek, publicou, em 2002, sua biografia não autorizada. O livro devassa sua vida pessoal e suas ligações junto aos quartéis de drogas no país, desde suas estreitas ligações com o mitológico Pablo Escobar, do cartel de Medelín.

Hoje, dezenas de parlamentares de sua base de apoio, incluindo um primo-irmão, senador Mário Uribe Escobar, estão presos por atividades paramilitares, ligadas ao tráfico pesado de drogas e ao assassinato de milhares de opositores ao governo, entre lideranças sindicais e populares. Além da posse ilegal de terras confiscadas dos camponeses expulsos pelos paramilitares nos departamentos de Sucre e Antióquia. O próprio presidente é alvo de investigação por suborno de membros do Senado para aprovação da emenda da reeleição.

São razões suficientes para as vitoriosas pressões que centrais sindicais de trabalhadores dos EUA vêm exercendo sobre seus senadores contra os acordos bilaterais de livre comércio, pretendidos por Bush e Uribe. As mesmas razões pelas quais a presença de Uribe tem sido vetada no Parlamento Europeu.

Razões de sobra para que a mídia tupiniquim abandone seu alinhamento automático com o governo Uribe e adote uma postura mais crítica. Verá que durante o governo Uribe, apesar dos bilhões de Washington, dos mercenários de Israel e dos assassinatos em massa, o tráfico de drogas aumentou, como aumentou o fosso social colombiano.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Mistérios e paradoxos


O mistério sagrado do capital

O escritor inglês, Julian Gough, lembra Max Weber para dizer que “os primeiros protestantes viam o sucesso econômico como um sinal de Deus de que alguém era celestialmente eleito. Foi um pequeno passo passar disso a buscar o sucesso para assegurar a salvação”. Gough também lembra Walter Benjamin: “O capitalismo pegou discretamente a Reforma Protestante e substituiu a religião por si mesmo: ele se tornou uma religião, a religião ocidental”.

Segundo Gough, tanto as altas finanças modernas quanto o cristianismo moderno usam a linguagem e instrumentos da ciência para fins que são religiosos, não científicos. “Ambos atendem uma necessidade, um anseio que as antigas formas de religião e capitalismo não mais atendem. A necessidade de um poder misterioso maior do que nós, no qual possamos acreditar. Ele precisa ser poderoso - mas também deve ser misterioso. E o mistério vem desaparecendo do mundo cada vez mais rápido, desde Galileu”.

Para o autor de Juno and June, “nós sabemos do que são feitas as estrelas e podemos computar seu curso pelos céus pelos próximos 10 mil anos. Nós podemos explicar as tempestades e inundações que antes eram evidência da ira de Deus. Mas à medida que o avanço da ciência removeu o mistério divino de grande parte da vida, o avanço do capitalismo de livre mercado o devolveu. Apenas a economia moderna pode atualmente fornecer forças que não entendemos. E precisamos disso em nossas vidas”.
Leia o texto completo de Gough postado pelo jornalista Olímpio Cruz Neto

Queria a Lua

Há certa complementaridade da matéria de Julien Gough, em Prospect de julho, com o excelente texto do jornalista Clóvis Rossi da Folha de S. Paulo desta quinta-feira, 03/07. Provavelmente convalescendo de recente e fastidiosa demência política que recém lhe acometeu, Rossi lembra Pietro Ingrao, comunista italiano de 93 anos: "Na minha terra, nas grandes noites estreladas de verão e primavera, dá a impressão de que se pode pegar a Lua, quando sai entre as montanhas. Quando pequeno, queria pegá-la”.

Segundo Rossi, o menino Ingrao pedia ao pai, como prêmio por fazer pipi antes de dormir, olhando pela janela na direção do vale e das montanhas e vendo a Lua brilhando: “Quero a Lua". Para Ingrao, a Lua simbolizava algo muito bonito que não se consegue agarrar. Ingrao cresceu e escolheu uma nova Lua para perseguir: o comunismo como "símbolo de algo muito bonito". Para Rossi, pode-se até não concordar com a escolha que fez o comunista, “mas não dá para negar que o mundo moderno tornou-se esquivo demais à busca da Lua, qualquer Lua”.

Rossi supõe, com razão, que há muita gente que tem lá suas "luas" individuais ou coletivas. E cita a seleção de futebol da Espanha que acaba de ganhar a Eurocopa, após 44 anos, assumindo um slogan mercadológico de “nada é impossível”. O atento jornalista se refere ao mundo político, onde já não se vê ninguém querendo agarrar a Lua. E completa: “Na melhor das hipóteses, administram o possível, nada mais. Talvez, se quisessem a Lua, iriam algo além do possível. Talvez”. Leia o texto completo de Rossi reproduzido no blog Estante.

Os paradoxos colombianos

Relevante questionamento foi produzido pela jornalista Eliane Cantanhede, na Folha de S. Paulo desta quinta-feira. Segundo ela, ninguém entendeu muito bem a ida de John McCain para a Colômbia em plena campanha eleitoral. E justamente no dia em que Ingrid Betancourt foi libertada de um cativeiro de mais de seis anos, junto com três mercenários dos EUA. Acrescentaríamos: em véspera do Quatro de Julho, maior feriado cívico estadunidense, e no dia em que Washington resolveu resgatar a Quarta Frota, a famosa esquadra que vai “proteger” o litoral do nosso continente. Contra eles mesmos?

Para Eliane, mais coincidências: McCain é o candidato do presidente Bush e, atrás do democrata Barack Obama nas pesquisas eleitorais, precisa de "mágicas". Mais: a bem-vinda libertação de Ingrid Betancourt fica na conta de Uribe, com um enorme saldo político e eleitoral num momento chave da Colômbia. Para reforçar Eliane: Uribe, embora muito cotado em popularidade, passa por grave crise institucional. Dezenas de parlamentares de sua base de apoio, incluindo um primo senador, estão presos por atividades paramilitares, ligadas ao tráfico pesado de drogas e ao assassinato de mais de mil opositores ao governo, entre lideranças sindicais e populares.

No Brasil, a julgar pelos recentes entusiasmos da mídia “global” com o presidente Uribe, já se cogita um apoio a um terceiro mandato. Desde que não seja para Chávez nem para Lula, claro. Enfim, mais razões à Eliane: “O resto da história ainda precisa ser muito bem contado, na base do quem, como, onde e, principalmente, por que. E, afinal, que raios McCain estava realmente fazendo na Colômbia?” Leia o texto completo de Eliane Cantanhede em Luis Nassif Online.

O Manifesto