terça-feira, 10 de novembro de 2009

O muro na cabeça

O ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira (Folha de S Paulo desta segunda-feira), quer que “Comemoremos, a queda do Muro de Berlim – ‘o ideal da liberdade se sobrepôs aos ideais da igualdade e da solidariedade’ – mas não nos deixemos enganar pelos radicais, sejam liberais ou socialistas. Estes fizeram revoluções que produziram sofrimentos e não resultaram no socialismo; aqueles se deixaram levar pelo neoliberalismo, promoveram a redução das taxas de crescimento (...) e beneficiaram apenas os 2% mais ricos da população”.

Na mesma Folha, o historiador russo Constantine Pleshakov, radicado nos EUA, diz que “Ao iniciar há 20 anos a derrubada do comunismo, russos e europeus do Leste nada entendiam de livre mercado, que esperavam que funcionasse como um passe de mágica para o consumo. (...) Em poucos anos, essas ilusões desapareceram, porque não é assim que funciona (...) Quando as propriedades estatais foram privatizadas, poucos privilegiados ficaram ricos em meses e o resto da população perdeu participação na riqueza nacional.

Mais pragmático, o historiador britânico Eric Hobsbawm diz que o principal efeito da queda do Muro de Berlim, em 1989, foi a desestabilização da geopolítica mundial em benefício da única superpotência remanescente – os EUA Como consequência, o mundo se tornou mais perigoso, mais inseguro. Já do ponto de vista econômico, Hobsbawm afirma que o pós-1989 levou a um recorde de desigualdade social nos países europeus sob influência da antiga União Soviética. (Folha de S Paulo deste domingo, 08/11).

“‘Muro invísivel’ ainda divide alemães: Para alemães ocidentais fim da barreira representou fardo econômico; Orientais têm saudades do pleno emprego”. Foi como o jornalista Lourival Sant’Anna, enviado especial do Estadão, resumiu a decepção em que se transformou a grande euforia de 20 anos atrás, quando “nada mais seria impossível”. Hoje, são muitos os alemães para quem “a barreira destruída passou a significar uma proteção perdida”. O muro continua vivo no que os alemães chamam de "o Muro na cabeça".

De um lado, os alemães ocidentais a reclamar da maciça transferência de recursos para o lado oriental, em infraestrutura e assistência social, que eles arcam por uma espécie de "imposto solidário”. Por outro lado, pesquisa da revista Der Spiegel mostra que 49% dos alemães orientais concordaram que a antiga "RDA tinha mais lados bons que ruins. Havia alguns problemas, mas a vida era boa.". Para outros 8% "a RDA tinha, na maior parte, coisas boas. A vida lá era mais feliz e melhor que na Alemanha reunificada de hoje".

Outra pesquisa, realizada na ex-RDA, confirma os dados da Der Spiegel: 38% dos alemães orientais consideram-se vencedores da reunificação; 23%, perdedores; e 30% dizem que ela lhes trouxe perdas e ganhos. Ainda segundo Sant’Anna, “jovens alemães orientais desempregados sonham com o ‘pleno emprego’ desfrutado por seus pais. (...) Muitas mães invejam a liberdade que suas mães tiveram de deixar os filhos na creche ou escola e trabalhar o dia inteiro”. Para Anja Weinhold, 33 anos, desempregada, “só não trabalhava quem não queria".

Resumo da ópera: a queda do muro de Berlim, há justos 20 anos, colocou mais uma vez a roda da história da humanidade em movimento. História que opõe um modelo de consumismo, competitividade fratricida e indiferença coletiva aos os velhos sonhos de solidariedade, de emancipação, de democracia. História que mostra que o homem do século XXI (no dizer do experiente jornalista Jânio de Freitas, da Folha) “não desaprendeu a construir muros para separação da humanidade e não aprendeu a demoli-los”.

4 comentários:

Lobo disse...

Alo Liberal, tudo bem? Muito boa a sua interpretação sobre a queda do muro. Muita gente lamenta esta queda, por tudo o que vc disse. Além do mais, colocar os orientais em competição com os alemães ocidentais foi horroroso – para os orientais.

Bom, de qualquer maneira esta data continua fatídica para os alemães: se a 09/09 comemoram a queda do muro, ninguém lembra que em outro 09/09, mas de 1923 eles passaram a comemorar o “golpe de estado” de Hitler, que iniciou a carreira do próprio, já que, golpe fracassado, ele aproveitou estas férias para escrever Mein Kampf enquanto seu estado-maior o projetava ao comendo do Partido dos Trabalhadores Alemães, embrião do P Nazista!!! A história, por vezes, é terrível com quem não a conhece!

Abraços. Lobo.

CHarles Santos disse...

E ainda há quem diga que a queda do muro foi o melhor para todos.
Ainda assim, falta derrubar mais um muro: o da hipocrisia do falso capitalismo e socialismo. Esse é o mais difícil.

Prof M Moura disse...

Os "velhos sonhos de solidariedade, de emancipação, de democracia" nunca se ralizaram. Em seu lugar o saldo genocida de mais de cem milhões de mortos. Não é atoa que os alemães estão festejando o aniversário da queda desse símbolo das ditaduras socialistas.
Mas o fantasma dessa idelogia assassina não foi, totalmente, exorcizado. Alguns, ainda, teimam em querer ressuscitá-lo.
--
Prof. Mauricio Moura

Vera S Campos disse...

Embora nao concorde com as ideias socialistas, vc escreve super bem.
Valeu.
abras
Vera

O Manifesto