sábado, 28 de março de 2009

Castelos de areia

O alpiste e o canarinho

O diálogo acima (1), embora somente gravado pela Polícia Federal (PF) antes das eleições de outubro do ano passado, tem mais de 50 anos. Não menos anciã é a fala do diretor da Camargo Correa ao explicar ao intermediário em Brasília que a lista com a s doações está “numa pasta de eleições”, onde “tem todos os caras que foram pagos” (...), “inclusive a colaboração oficial”. Com sua conclusão: "Tem as duas, tá?"

Faz mais de 50 anos que se sente no ar o mau cheiro dos “indícios robustos” da existência de doações políticas, legais e ilegais, como revelado nesta semana pela procuradora Karen Kahn. O fedor é o mesmo que exalam Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez. O mesmo que empestam o ar os atuais partidos políticos envolvidos. Do mesmo modo como antes catingavam PSD, UDN e, depois, a ARENA.

Além dos novos e sofisticados instrumentos de transferência de dinheiro para burlar uma lei cada vez mais atenta, nenhuma novidade existe. Nem a forma como essas empresas apossam-se do poder e capturam a alma dos seus principais ocupantes. Todos fisgados pela mesma ansiedade flagrada num dos doleiros na operação da PF, a cantar para o diretor da empreiteira: "Professor, o canarinho aqui está precisando de alpiste".

A novidade? A provável participação da vetusta Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) na intermediação do fluxo de propinas para políticos (2). Sua pronta reação negando o fato faz coro com a “perplexidade” da Camargo Correia diante da “invasão” de sua sede pela PF em São Paulo. Uma defesa reativa igual a do PSDB, PPS e DEM. Todos receberam doações em angelical “acordo com as leis do país”.

A surpresa? A ninguém é dado o direito de criticar as defesas imediatas dos partidos envolvidos ou dos senadores José Agripino Maia (DEM-RN) e Flexa Ribeiro (PSDB-PA), que atribuíram a um “viés político” a denúncia pela PF das mal explicadas doações recebidas (3). A surpresa se deu pela aguerrida defesa das doações da construtora, feita pelo ex-presidente FHC: “pelo que vi, era legal, não tinha nada de irregular".

Fernando Henrique Cardoso ironizou a ausência do PT na lista de doações da Camargo Correia: “Só a partezinha da oposição que aparece" (4). O ex-presidente “suspeita” dos resultados da Operação Castelo de Areia da PF com o mesmo descaso com que tratou a instituição ao longo dos seus dois mandatos. No seu tempo, as atividades de combate à corrupção eram sufocadas no nascedouro e jogadas sob os tapetes do Planalto.

A surpresa menor ficou por conta do ministro falastrão Gilmar Mendes. Ele voltou a criticar nesta sexta-feira a Polícia Federal ao dizer que as grandes operações "criam um cenário de terror", ameaçam institucionalizar “um modelo anormal no Brasil". (5) Esquece o linguarudo que anormal é desfavorecer a credibilidade do Supremo com decisões de risco, como no caso do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.

N a z i s i o n i s m o

Matéria da agência Reuters, desta segunda-feira oferece dados de relatórios do Conselho de Direitos Humanos da ONU que revelam diversas violações de Israel na recente invasão contra a faixa de Gaza. As violações incluem o ataque a civis e o uso de criança como escudo humano. A ONU pede o fim imediato às restrições israelenses ao abastecimento humanitário de Gaza e uma investigação internacional sobre o conflito. (6)

O diário britânico The Guardian reuniu provas de crimes de guerra cometidos por Israel durante a recente ofensiva contra a Faixa de Gaza. Entre os crimes citados pelo jornal está o uso de crianças palestinas como escudo humano e os ataques diretos contra médicos e hospitais. A ONU também fala em “alvos civis, particularmente casas e seus ocupantes” (...), “mas escolas e instalações médicas também foram atingidas”. (7)

Para a Organização Mundial da Saúde, mais da metade dos 27 hospitais e das 44 clínicas de Gaza foram bombardeados. A organização “Médicos pelos Direitos Humanos de Israel” denunciou as violações: "Observamos uma forte degradação ética por parte das Forças de Defesa Israelenses no que se refere ao tratamento da população civil de Gaza, que equivale de fato a um total desprezo pelas vidas dos palestinos".

Segundo The Guardian, os depoimentos dão força a uma chamada internacional para que se investigue a operação israelense. Três adolescentes contaram ao jornal londrino que foram tirados de casa e obrigados a se ajoelhar em frente a carros de combate israelenses para evitar que os palestinos atacassem os invasores. O relatório da ONU revela um total de 1.440 mortos, entre eles, 431 crianças e 114 mulheres.

O número de crianças mortas é pouco maior que o dobro daquele que a Força de Defesa Israelense (IDF) admite. De qualquer modo, ele retrata a gravidade das atrocidades cometidas. Na semana passada, segundo o jornal israelense Haaretz (8) um comandante da IDF denunciou que rabinos do Exército disseram às tropas que lutavam na ofensiva militar que o confronto era uma "guerra religiosa" contra os pagãos.

"A mensagem (dos rabinos) era bem clara: nós somos judeus, nós viemos para esta terra por um milagre, Deus nos trouxe de volta a esta terra, e agora nós precisamos lutar para expulsar os pagãos que estão interferindo na conquista da terra santa", disse o militar ao Haaretz. Alguns veteranos da Academia Militar disseram ao jornal: “As vidas de palestinos, digamos que são menos importantes que as de nossos soldados”.

À Rádio Army, de Israel, o militar Yoav Galant afirmou que o saldo "baixo" de mortes de civis foi sem precedentes ao se considerar o tipo de confronto, no qual o Exército de Israel entrou em cidades e áreas populosas “é uma conquista para a qual não há exemplos na história das campanhas militares, não apenas em Israel". Para ele, a IDF mostrou que “é capaz de fazer o que fez aqui em outros lugares também".

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