sábado, 31 de outubro de 2009

MELEQUEOQUE – O Mundo versus EUA, Israel e... Palau

Pelo 18º ano consecutivo, a ONU discute e condena o embargo estadunidense contra Cuba. É a primeira votação sob o governo Barack Obama, que acaba de renovar o bloqueio que sufoca há quase 50 anos a frágil e heróica economia cubana. Nesta quarta-feira (28/10), na Assembleia Geral da ONU, 187 países rejeitaram o embargo e somente Israel e... Palau apoiaram os EUA.

A República de Palau é um pequeno país insular da Micronésia, no Oceano Pacífico, entre os mares das Filipinas a oeste, Indonésia e Papua-Nova Guiné a sul e Estados Federados da Micronésia a leste. Capital: Melequeoque. Apesar de ser nominalmente um país independente, Palau assinou um Tratado de Livre Associação com os Estados Unidos da América (fonte: Wikipédia)

Israel, para quem não sabe: o governo nazisionista no poder, nega água potável e reposição alimentar ao gueto da Faixa de Gaza, hoje criminosamente fatiado por ocupações ilegais de colonos judeus. Mais: Israel não se submete ao Tratado de Não-proliferação nuclear, o que justifica acusações de dois pesos e duas medidas à “comunidade internacional” quando esta quer, por exemplo, condenar o projeto nuclear do Iran.

Segundo Roger Cohen, editor-geral do Herald Tribune (16/10), “Mais de 60 anos após a criação do Estado moderno, Israel ainda não tem fronteiras estabelecidas, não tem Constituição, não tem paz. Nascido de um horror excepcional, o Holocausto, a normalidade tem se mostrado esquiva. A ansiedade dos judeus da diáspora não deu lugar à tranquilidade, mas a outra ansiedade. A fuga dos muros deu origem a novos muros. A psicose da aniquilação não desapareceu, mas adquiriu nova forma”.

Já os Estados Unidos... Pelas projeções otimistas, com base nas “boas intenções” da era Obama, de um lado, e, do outro lado, no irracional estado de permanente beligerância do atual governo de Israel, não nos surpreendamos se no próximo ano nossa manchete for: Israel contra o mundo. Havana desta vez obteve respaldo recorde, uma vez mais, contra embargo. Resultado que confirma a postagem deste boletim, de 31 de outubro do ano passado, sob o título “Estados Unidos, Israel e... Palau contra o mundo”:

"Vocês estão sozinhos, completamente isolados’, disse pouco antes da votação Pérez Roque, dirigindo-se à delegação estadunidense. Em seu discurso, o chanceler cubano disse que ‘sete em cada dez cubanos passaram a vida sob esta política irracional e inútil’. E que ‘o bloqueio é mais velho que Barack Obama e que toda minha geração".

“Cidadãos brasileiros, por exemplo, não podem adquirir um computador portátil da DELL Brasil por meio de crédito se, ao preencher o cadastro, declarar que em tendo oportunidade gostaria de visitar Cuba. A empresa informou ao jornal O Globo que a restrição segue normas de Washington”. “O embargo econômico à Cuba foi instituído pelos Estados Unidos em 1962, três anos após a deposição do ditador Fulgêncio Batista pela Junta Militar Revolucionária cubana. E antes da fracassada invasão da Baía dos Porcos, financiada pelos Estados Unidos”.

domingo, 25 de outubro de 2009

O lado de Judas

Longos anos se passaram para que a Folha de S Paulo admitisse, como admitiu em editorial, nesta sexta-feira, que “gerência técnica, tática de alianças, governabilidade. A política como ‘arte do possível’. Conceitos e lemas desse tipo fixaram-se, ao longo do tempo, como ingredientes típicos da retórica e da prática tucanas”. A afirmação, como se vê, é parte de uma análise bastante retardada em honra da verdade. Essa e muitas outras deixaram de ser ditas em tempo real, para não contrariar interesses do próprio jornal.

No preâmbulo de mais essa manifestação política, o jornal admite que “no governo FHC, o tema da ‘modernização’ do Estado brasileiro nunca representou empecilho para que se fizessem alianças com o que sempre existiu de mais arcaico e oligárquico na política brasileira. Muda o presidente, muda o partido, mas não se altera a tolerância com o patrimonialismo e com o atraso”. E admite que Lula tem razão ao dizer que não se governa no Brasil “fora da realidade política”: “Ninguém diria o contrário”, diz a Folha.

Entretanto, o editorialista cobra do presidente sua promessa de mudar essa realidade política: “A política não é apenas ‘a arte do possível’, como dizia Fernando Henrique Cardoso – mas a arte de ampliar esses limites”, diz o jornal. E coloca nas mãos do núcleo no poder a responsabilidade por uma reforma política, fiscal ou previdenciária, pendentes há décadas. Como se a Folha não soubesse muito bem que cada feudo de poder – econômico, grupal, familiar, político – quer um modelo de reforma que lhe beneficie.

Grupos poderosos, como os do agronegócio, das comunicações, das altas finanças, conseguem até ocupar altos postos de comando nos ministérios da Agricultura e da Comunicação, Banco Central, a garantir a manutenção histórica do patrimonialismo oligárquico e do arcaísmo, ora condenados pela Folha. Ela mesma uma legítima representante desses grupos, pouco ou nada interessados em mudança. A não ser para manutenção dos seus próprios privilégios. Nunca para promover mais democracia.

A reforma que interessa à Folha e à mídia, legítimas representantes das oligarquias, não é a mesma que interessa à sociedade como um todo. Mais do que a reforma agrária, que democratize o acesso à terra, prefere-se a demonização dos movimentos sociais. Mais do que os investimentos em políticas sociais, que elevem o perfil distributivo, melhor condenar os “gastos do governo”. A mídia jamais concordará em discutir um modelo voltado ao direito à comunicação ou à democratização dos meios de comunicação.

(Em face de repetidas demonizações dos movimentos sociais pelos inimigo da reforma agrária, circula pela internet um Manifesto em Defesa do MST (1), subscrito por intelectuais, movimentos sociais, personalidades. O manifesto mostra os interesses por trás da desestruturação dos movimentos pela reforma agrária no Brasil. Como o agronegócio, que quer impedir a revisão dos índices de produtividade agrícola, que estabelece as bases da produtividade da terra no Brasil e favorece a reforma agrária).

Em vez de preservar o meio-ambiente, o conservadorismo opta por ampliar a fronteira agrícola, o desmatamento. Mais do que discutir a violência ligada ao trafico de drogas e ao alcoolismo, melhor aliar-se aos anunciantes de bebidas. Mais que uma reforma previdenciária que garanta justos direitos de cobertura, prefere-se mitificar o “déficit da previdência”. Reforçando à avidez dos grandes bancos que bancam a previdência privada. A depender da Folha, pois, longe está a ampliação da “arte do possível”.

É hilário, como se vê, o movimento da mídia brasileira e dos partidos de oposição a condenar o pragmatismo do governo diante da realidade brasileira que transforma a política como a “arte do possível”, que todos praticaram, sem o menor interesse na “arte de ampliar esses limites”. Todos os políticos hoje levados à execração pública foram sempre aliados e úteis aos que hoje os querem condenar. A Folha de S Paulo, a mídia brasileira, deve à sociedade uma análise, isenta de hipocrisia, sobre a fisiologia e o atraso em nossa política.

(1) adesões podem ser feitas no endereço: http://www.petitiononline.com/boit1995/petition.html

quarta-feira, 14 de outubro de 2009


“Opinião partidarizada, travestida de jornalismo”
(Anita Dunn, Diretora de Comunicação da Casa Branca)

“... temos de ser mais enérgicos, em vez de sempre dar explicações, fugir do debate ou só nos defender" – “A imprensa vive de falar. (...) por isso, a imprensa sempre pode usar qualquer mínima coisa e converter em notícia, mesmo que, para isso, os fatos sejam distorcidos. Por que precisamos aceitar isso?". Disse, na semana passada, em rede nacional, Anita Dunn, Diretora de Comunicação da Casa Branca, acusando a Rede Fox News de funcionar como uma organização política, “apêndice do Partido Republicano”.

A paciência da Casa Branca começou a desabar em setembro, quando o New York Times publicou, em primeira página, que há um "crescimento nas pesquisas de pais e mães preocupados com o conteúdo do discurso de Obama para crianças e adolescentes" O estranho é que essa publicação ocorreu antes mesmo de o jornal, e os “pais e mães” conhecerem o teor do correto discurso presidencial. Some-se o caso do Washington Post, a distorcer legítimas nomeações de Obama para a Administração Federal.

"Trata-se de opinião partidarizada, travestida de noticiário e de jornalismo", diz Anita Dunn. Esse “modismo”, a sensibilidade política de Gramsci credita ao conservadorismo, cada vez que se torna fraco, na luta pelo poder. É quando a imprensa assume o comando da agenda oposicionista e ocupa seu lugar. Muitas vezes, com um propósito golpista implícito. Ou não é que vem acontecendo no Brasil? Não é diferente o processo na Argentina. Quem, senão a mídia, comandou o golpe contra Chávez em 2002?

O caso da Casa Branca é mais fácil de resolver porque nos EUA, como nos principais países da Europa, não existe a esculhambação latina da propriedade múltipla dos meios de comunicação, nem se convive com tal concentração da propriedade televisiva. É justamente o que vem corrigir a nova Lei Audiovisual de Cristina Kirchner. Recém aprovada por ampla maioria no parlamento argentino, com apoio dos sindicatos dos jornalistas, ela inibirá o monopólio que transforma a Argentina em feudo do Grupo Clarín.

A lei prevê que as organizações da sociedade civil, não-governamentais, terão acesso a um terço do espaço audiovisual, igual que as mídias públicas e privadas. Ela impede também uma mesma empresa de possuir um canal aberto e um canal a cabo na mesma região. É por isso que a Lei Cristina é tratada pela mídia brasileira como um “instrumento de força contra a liberdade de expressão, para prejudicar o Clarín”. Uma defesa corporativa, pois não é segredo que também há muito o que se consertar por aqui.

Por aqui, as quatro grandes corporações – Globo, Veja, Estado e Folha – não conseguem criatividade necessária para oferecer uma eventual posição política favorável ou mesmo tolerante com o governo do “lulo-petismo”. Mas, não se pense que a reação brasileira ficará limitada à “azia” de Lula, causada pela itura dos nossos jornais. Também não será pela não renovação do domínio concessionário, ao estilo Chávez. Uma Lei Cristina, no Brasil, virá como resultado de amplo debate nacional do setor. (*)

(*) Os debates já começaram a se realizar nos diversos Estados, como fase preparatória para a 1ª Conferência Nacional de Comunicação – Confecom – a ser realizada em 15 a 17 de dezembro em Brasília DF.


terça-feira, 6 de outubro de 2009

Ombudsman reconhece prática panfletária na Folha de S Paulo

O ombudsman da Folha tem por atribuição “criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores”. Assim, Carlos Eduardo Lins da Silva pôde, neste domingo (4/10), analisar a edição da terça-feira anterior e concluir: “no terreno da opinião, registrou-se na edição de terça incômoda unanimidade na página A2, em que todas as colunas e o editorial adotavam ponto de vista único sobre o papel do Brasil na crise (hondurenha). Em benefício do leitor e em nome da diversidade, outras posições precisam aparecer no jornal”.

De fato, naquela terça, a Folha abriu a página A2 com a acusação de que o “Brasil se intromete mais do que deve em Honduras”. O editorial desfilou uma série de comparações descontextualizadas com antigas ações do Itamaraty em relação a Cuba e Irã e terminou por classificar como “tênue de ilegitimidade democrática” o regime imposto aos hondurenhos pela força. O dono do jornal repete, aqui, a figura da “ditabranda”, afago com que a Folha brindou, meses atrás, a cruel ditadura brasileira, de triste memória.

Na mesma linha ideológica, a coluna do jornalista Clóvis Rossi abriu suas baterias contra o que denomina covardia e indecência o presidente deposto convocar, a partir da embaixada brasileira, a resistência da população hondurenha contra os golpistas no poder. Afirma Rossi que “não há no drama hondurenho (...) um só personagem que pessoas decentes gostariam de convidar para o aniversário dos filhos”. Afirmação é grosseira e insustentável diante de reiteradas manifestações da comunidade internacional.

Ainda na página A2, Eliane Cantanhêde, cuja coluna é campeã de citações contra o governo Lula, destilou seu veneno de indisfarçável militante tucana, acusando o Brasil de “meter os pés, as mãos e a embaixada em Tegucigalpa na defesa apaixonada de um dos lados, o do presidente deposto”. A surpresa da página analisada pelo ombudsman da Folha ficou por conta de Carlos Heitor Cony, que comparou o democrático acolhimento brasileiro com ações truculentas estadunidenses mundo afora.

Será que a conclusão do jornalista Lins da Silva configura uma surpresa? Será que a diversidade “em benefício do leitor” que ele cobra da Folha é vista em O Globo? Na Veja, ou nos jornalões da TV? Ela tem sido vista nas sucessivas edições diárias da própria Folha? Atentemos ao que têm dito os editoriais da nossa mídia em relação à escolha do Rio para sediar os jogos, ao ganho de status do G20 no cenário mundial, à diminuição do risco de investimentos no Brasil, ao abrandamento da crise mundial por aqui.

Seja como for, o ombudsman acertou na mosca: outras posições deveriam ser estimuladas pelo próprio jornal, em nome da diversidade e principalmente em benefício do leitor. Caso contrário, não se detém tendências de falência da credibilidade do jornalismo que campeiam mundo afora. Um efeito bumerangue resultante das distorções do conceito de liberdade de imprensa. A liberdade que não pode ser separada do direito constitucional universal do cidadão à informação.

O Manifesto