William Bonner, do Jornal Nacional, costuma dizer que todas as noites sua equipe tenta colocar um elefante dentro de uma caixa de sapatos. Sempre conseguem. Trata-se da configuração do jornal de maior audiência na TV brasileira. Significa que grande quantidade das notícias produzidas é jogada na lata do lixo e outras tantas somente são divulgadas após lapidar edição que envolve a escolha de enquadramentos, incidências e aparas. Por ficarem de fora, não serão discutidas pelo público: o “lixo”, outros enquadramentos, outras incidências, outras maneiras de ver e de apresentar os temas.
É o que se denomina agendamento (agenda setting), teoria bastante conhecida em todo o mundo por qualquer estudante de comunicação, desde os anos 70, que revela como os meios de comunicação determinam a pauta (agenda) para a opinião pública. Ou seja, resolvem o que e de que forma – de que ângulo, de que ponto de vista, sob que aspecto ou profundidade – nós, indefesos leitores/ouvintes, devemos discutir a história de cada dia. Pois, para muitos, o que não deu no Jornal Nacional, a caixa de sapatos de Bonner, não aconteceu.
Tem-se no agendamento o instrumento de impor ao leitor/ouvinte uma carga de opiniões político-ideológicas ou culturais que interessam às instâncias de poder vinculadas aos donos do veículo de comunicação. Dito de outra forma, a linha ideológica nasce de modo “espontâneo”, das necessidades dos profissionais da comunicação de manter uma relação de boa convivência e conforto em seus postos de trabalho. Ou seja, a linha ideológica da notícia nasce não só do perfil intelectual e cultural do jornalista, de suas relações e afinidades ou do seu compromisso social, mas também e sobretudo do tipo de (in)dependência profissional com seu veículo empregador.
De qualquer forma, para a unanimidade dos estudiosos não há isenção na produção de qualquer matéria jornalística, mesmo a que não é rotulada como opinativa. E assim, o ouvinte/leitor recebe o “benefício” do agenda setting para não precisar pensar. Já na década de 20, dizia o Estadão: “Um verdadeiro jornal constitui para o público uma verdadeira bênção. Dispensa-o de formar opiniões e formular ideias. Dá-lhes já feitas e polidas, todos os dias, sem disfarces e sem enfeites, lisas, claras e puras” (Editorial do O Estado de São Paulo, de 14/01/1928).
Pode-se inferir então que um mergulho no “lixo” e nas aparas, e um exame por ângulos e critérios ideológicos diversos no noticiário jornalístico, certamente produziriam caixas de sapatos diferentes da de Bonner. Um mergulho e um exame que serão facultados a qualquer ouvinte/leitor quando o veículo de comunicação lhe oferecer os diversos ângulos e a totalidade dos fatos, para que exerça criticamente sua análise e sua escolha. Será, enfim, a oportunidade de poder formar sua opinião, sua versão dos fatos.
Para que isso aconteça, a sociedade precisa se dar conta de que existe um direito que a Constituição lhe garante: o Direito à Informação. Informação em sua integralidade, que permita acesso a uma leitura crítica, personalizada, liberta das amarras opinativas unidirecionais viciadas. Democraticamente aberta a múltiplas interpretações e juízos. Múltiplas caixas de sapatos...
Um novo olhar
Uma amostragem do que “não aconteceu” (o lixo e as aparas do Bonner) pode ser vista no noticiário dos últimos dias: Na última quinta-feira (24/12), o prestigiado jornal francês Le Monde escolheu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como "o homem do ano de 2009. Por seu sucesso à frente de um país tão complexo como o Brasil, por sua preocupação com o desenvolvimento econômico, com a luta contra as desigualdades e com a defesa do meio-ambiente”.
Poucos dias antes, Lula foi escolhido pelo jornal espanhol El País a primeira das cem personalidades mais importantes do mundo ibero-americano em 2009. Com direto a foto de capa inteira e perfil assinado pelo próprio primeiro-ministro da Espanha, José Luis Zapatero. "Homem que assombra o mundo", "completo e tenaz", “por quem sinto uma profunda admiração", escreveu o premiê espanhol.
Neste dia 29 de dezembro, o jornal britânico Financial Times escolheu o presidente brasileiro como uma das 50 personalidades que moldaram a última década, porque “é o líder mais popular da história do Brasil”. “Charme e habilidade política... baixa inflação... programas eficientes de transferência de renda...", diz o jornal.
Há nestas notícias da imprensa internacional o reflexo de um novo dia, de um novo tempo de novos sonhos. Um novo olhar do mundo sobre o Brasil. No entanto, para o leitor/ouvinte dos nossos jornalões, simplesmente nada disso aconteceu.
10 comentários:
É que a mídia ainda aposta na pobreza do Brasil, como sempre fez a elite tupiniquim, que ela acha que representa. Mas até a elite não quer isso tanto assim. Afinal, o mercado interno está aí e eles não são tão idiotas - apesar da grande desigualdade social.
Vocês já repararam na cara feia dos apresentadores da TV paga quando algum entrevistado diz que o Brasil vai bem obrigado?
Belíssima a análise.
Aproveito para agradecer por mais esse ano de notícias sem elefantes na caixa de sapatos.
Feliz 2010: muita saúde...muita saúde, paz e mais realizações.
Um fraterno abraço,
Daniel da Rocha Leite.
Nao acredito que recebebo esse tipo de lixo no meu email!
Alo Liberal.
Sobre seus comentários, eu diria que a maioria dos jornalistas tem a opinião de que jornal foi feito para vender, não para dizer a verdade. A versão é mais importante que o fato. Agora, o povo brasileiro tem alguma culpa, por que há também por aqui uma maioria silenciosa que engole tudo! Não questiona, apenas aceita o mingau de merda que lhe oferecem. Por isto Lula é tão atacado aqui, enquanto FHC, o maior criminoso da nossa história nada sofreu apesar de toda a corrupção. Bom, não vamos nos estender,mas eu completaria dizendo que Collor foi cassado não por honestidade do legislativo, mas por não dividir o bolo da corrupção com os membros do congresso.
Por isto a gente vê Lula sendo elogiado no exterior e severamente atacado por estas plagas.
Caros editores,
È tão evidente para mim a manipulação da informação e a carga emocional aplicada na transmissão de noticias que nem precisaria alguém comentar. È um verdadeiro espetáculo, como uma novela.
Entretanto, è bom saber que existem outras pessoas que vêem isso e que tentam mostrar o outro lado da noticia.
Mas tenho uma duvida! Por que, apesar de ser tão evidente manipulação, esta farsa continua com uma audiência tão grande ? Por ignorância, por comodismo das pessoas ou existe um programa de lavagem cerebral tipo aquela que vemos em filmes de ficção cientifica?
É ISSO AI SIDNEY
ABRAÇO
Que paraíso mental vocês estão vivendo. A nossa saúde está uma "maravilha"; altas taxas de "emprego"; todas as crianças "estudando", mensalações; as nossas estradas são um tapete; transportes públicos são exemplo para o mundo - ninguém anda em ônibus, trem, metrô lotado; corrupções, compra de sindicatos, de uniões estudantis, programas de governo que nada resultaram como o FOME ZERO. Única coisa "positiva" foi bolsa família, ou melhor, o voto-cabresto moderno.
Acorda, Brasil! Como pode um governante que tinha ódio de Collor, Sarney,Delfin, agora... são seus amores.
Análise sensacional. Obrigado por escrever isso. Estou re-encaminhando e quero imprimir para repassar para outras pessoas citando a fonte.
Faltou o prêmio de Estadista do Ano, conferido pela rainha Elizabeth.
http://wwo.uai.com.br/UAI/html/sessao_3/2009/11/05/em_noticia_interna,id_sessao=3&id_noticia=134837/em_noticia_interna.shtml
Aí em cima, os ca~es ladram e a caravana DILMA passa!! Unidos venceremos!
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