quinta-feira, 4 de março de 2010

SUBMISSÃO

1. O final dos anos 90 foi marcado por um sem número de visitas de certos senhores, à vezes senhoras, muito elegantes, com pastas executivas e diligentes assessores, que desembarcavam no planalto central e, sem a menor cerimônia vasculhavam arquivos e gavetas do Banco Central. Objetivo? Remexer nossos papeis para saber se estávamos seguindo os rigores de suas normas de proteção para os lucros dos seus não poucos investimentos. Para checar se estávamos aplicando as receitas que adequaram o Plano Real, o plano econômico criado por Rubem Ricupero durante o governo Itamar Franco, para proteção de seus estimados dólares.

Esses senhores/senhoras, brancos, de olhos azuis, como seus patrões do Fundo Monetário Internacional FMI, faziam a festa dos nossos submissos “especialistas” em economia e dos jornalistas metidos a isso. Eles começaram a aumentar a frequência de suas amáveis visitas, conforme relembrou outro dia o sempre atento Delfim Neto, pouco antes da reeleição de FHC, quando a interferência de Bill Clinton fez o FMI trazer a mais quase uma centena de bilhões de dólares que evitaram a quebra do nosso país, fruto de irresponsável persistência fernandina/malaniana em levar até a eleição a falsa equivalência de um dólar por um real. Levou, ganhou a eleição e quase quebra o país.

Um mês depois, mudou os rumos da nossa economia. E durante o segundo mandato continuaram os elegantes desembarques em Brasília. Hoje, essa gente sumiu, e há quem tenha saudades. O conhecimento dessa memória está muito acima da questão plebiscitária entre os governos FHC e Lula. Ela é do conhecimento geral daqueles que são do ramo. Entretanto, os partidos de oposição adotaram a ladainha da balela e da fraude. Os “especialistas”/colunistas, repetem às escâncaras, a idéia de que o real é uma invenção milagrosa do governo tucano e que o governo petista deu certo porque seguiu a mesma cartilha. Não nos deixemos enganar, a história é bem outra.

2. Há uma outra ladainha, com igual ranço de gosto pelo colonialismo, que nossos diligentes colunistas/editorialistas costumam repetir, como macacos de imitação. Essa diz respeito à expectativa com as visitas de outros senhores/senhoras, também elegantes, que aqui desembarcam. A vinda de Hillary Clinton, dos reis da Espanha, os da Suécia, o primeiro-ministro da Itália, o ministro do Exterior da Alemanha, depois Obama, causa prazeres quase orgásticos. Cantanhêdes acreditam que essa gente vem aqui para puxar a orelha do presidente Lula em razão da insubmissão da nossa política externa aos desejos de Washington ou outros representantes do mundo ocidental cristão.

Em outro terreiro, muito menos rançoso, considera-se esse desfilar de personalidades do topo da pirâmide política mundial em nossa praia como uma busca diplomática de uma relação com um novo país chamado Brasil. Conhecer um exitoso projeto de governo e plantar relações de troca diante de um mundo multipolar. No caso dos EUA, pela leitura dos seus próprios especialistas¹, Hillary vem tentar corrigir seu pedantismo inicial de julgar ainda ser nossa região um quintal dos EUA², esquecendo justamente a multipolaridade em que o mundo se transformou. Sua nova postura sem a arrogância de sempre frustra nossos conterrâneos, portadores do rodriguiano complexo de vira-latas.

Não há o que discutir com relação a Cuba e ao Irã, a não ser que se aceite discutir as propostas brasileiras de fim do maldito bloqueio contra o povo cubano e de uma solução diplomática para os iranianos. Sem as botas sujas de sangue dos Estados Unidos. E se quiserem discutir direitos humanos, que se comece pelo gueto de Gaza, com o povo palestino sufocados pelo sionismo de estado; pela base de Gantanamo e as prisões clandestinas estadunidenses mundo afora, onde se faz pós-graduação em tortura; pelo Afeganistão, onde se despeja bombas sobre hospitais e escolas; pela Colômbia, onde um governo sustentado pelo tráfico de drogas, assassina em massa camponeses e lideranças sindicais.

Afinal, o perigo atômico de Ahmadinejad, feita pela “comunidade internacional”, mais parece o perigo das armas de destruição em massa que justificaram a destruição de um país como o Iraque, um dos berços da civilização mundial, como o Irã. Por outro lado, não se vê essa mesma “comunidade” cobrar dos seus, como os Estados Unidos, o cinqüentenário compromisso com o desarmamento nuclear. Washington não dá o menor passo para diminuir seu estoque de ogivas nucleares e ainda estimula os projetos de bombas nucleares em Israel, Paquistão, Índia. E mais; espalham seus artefatos bélicos e disseminam muita discórdia no mundo árabe³. E outros mundos.

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