terça-feira, 29 de março de 2011

Nova guerra fria em múltiplos palcos.

Nova guerra fria em múltiplos palcos.

Em nada interessa à “comunidade internacional” qualquer solução que dê aos países árabes, soprados pelos ventos da insurgência, a possibilidade de governos avançados no rumo da Democracia. Surpreendido no Egito e na Tunísia, o Ocidente (chamemos assim as forças que há tempos se habituaram a uma relação colonial com os povos do Oriente Médio) perdeu o controle do processo de queda das respectivas ditaduras. Agora, recomposto do susto, cuida de assumir o controle da nova situação. Além dessa, novas tarefas se impõem: há outros ditadores também em perigo.

Na Líbia, em adiantado estado de insurgência, a oportunidade de se livrar uma liderança não confiável, embora aliada. Inda mais por ser hostil a Israel. Diferente, neste aspecto, das outras ditaduras que, como o Egito e a Arábia Saudita, garantem ao Ocidente o controle da Região. Melhor ainda: relacionam-se bem com o governo belicista de Netanyahu. Ao afastar Gaddafi, o Ocidente, sob a liderança dos EEUU, quer garantir, a um só tempo, a estabilidade do mundo árabe e seu controle sobre ele. Em jogo, uma geopolítica mega-produtora de petróleo. E a distribuição de bases militares da OTAN.

E como fazer com a rebeldia popular que começa a tomar vulto, contrariando a boa paz nas demais ditaduras amigas? Na última semana, a Arábia Saudita encontrou a fórmula: os ditadores reúnem suas máquinas de guerra e tratam de extirpar coletivamente os tumores, onde eles estiverem. Foi assim que o ditador do Bahrein conseguiu forte repressão contra manifestantes desarmados. E o Ocidente nem precisa manchar as mãos de sangue. Apenas uma hipócrita vista grossa aos massacres que têm veementes protestos de significativas lideranças religiosas e políticas regionais.

E o que leva o Ocidente a apoiar massacre de ditadores contra seus povos? Ou a imobilizar, pela força, um ditador-problema, arrasando a infra-estrutura do seu país? A forjar uma confusa autorização no Conselho de Segurança da ONU, usada como instrumento de morte de civis, justamente o objeto de proteção que teria motivado a resolução da ONU? Robert Fisk, no The Independent¹, lembra que está em curso uma “extraordinária tempestade que varre a região, o espetacular despertar de um mundo árabe”. Uma tempestade que não interessa ao sionismo belicista de Israel nem à avidez do Ocidente pelo controle da geopolítica médio-oriental. Tampouco interessa aos velhos ou novos ditadores.

Mais aqui, menos acolá, não para de ventar. Na Arábia Saudita, no Bahrein, na Jordânia, Iêmen, Kuwait, Qatar. Ventos de matizes ideológicos diferentes, todos, porém, com cheiro forte de Democracia. Não importa o esforço da diplomacia ocidental em tentar desviá-los, como vem fazendo, ao tentar jogar sunitas contra xiitas, tribos contra tribos, árabes contra árabes. Os árabes sabem que os exércitos estrangeiros que invadem a Líbia, que destroçam o Iraque e o Afeganistão, que mantêm um gueto na Faixa de Gaza, não estão lá para defender o povo árabe.

Há, ainda, uma questão iraniana: independentemente de sua relação com o poder, quando a juventude do Irã, reunido na Praça da Liberdade em Teerã, louva sua luta por Soberania², o faz com slogan muito emblemático: “morte aos EEUU!” Significa repúdio ao intervencionismo estrangeiro. Não é outro o sentimento do jovem professor quando sugere: “alguém deveria lembrar ao Sr. Obama que ele não foi eleito presidente do mundo”. O Líder Supremo do Irã, Aiatolá Seyed Ali Khamenei, promete: “Os EUA continuarão a ser derrotados”.

E não é diferente o sentimento em outros terreiros médio-orientais. Jovens palestinos sentem-se ultrajados pelo roubo de terra que Israel pratica, para construir colônias exclusivas para judeus, na Cisjordânia. São sentimentos indicativos de que qualquer resultado da atual tempestade que agita a juventude árabe significará dificuldade para EEUU e seus aliados. Neste cenário Kaveh L Afrasiabi, do Asia Times Online² não vê qualquer sinal de acomodação entre os interesses em disputa. Afrasiabi acredita, com razão, que “se arma nova guerra fria a ser disputada em múltiplos palcos em todo o Oriente Médio”.

(1)http://www.independent.co.uk/opinion/commentators/fisk/robert-fisk-right-across-the-arab-world-freedom-is-now-a-prospect-2248975.html

(2) http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MC24Ak02.html



Um comentário:

Antonio Fattore disse...

As novas guerras frias


Nova "guerra fria" no Meio Oriente? Na verdade na Libia e' ja' "guerra quente".
Mas o que o Ocidente esta' armando como futura guerra fria (com o risgo que possa virar a terceira e final Guerra Mundial) e' aquela contra a China.
A China e' o que foi 40 anos atras foi a União Sovietica.Com uma diferença fundamental:conseguiou garantir um desenvolvimento economico que tirou da miseria 1 bilião de pessoas e pode repesentar um modelo para os paises pobres.E a Urrs collapsou e a China resistiou.
E' evidente que a intervenção militar do Ocidente na Libia tem tb como objetivo strategico bloquiar a inflencia chinesa na Africa.
Hoje a China não esercita aquela atração ideologica que tinha a velha Urss.E o governo chines mesmo não quer ser o "pais guia" de um bloco politico internacional.Isto poria o pais em rota de colisão com a unica super potencia militar do mundo:os EEUU.E o risgo de um enf rentamento militar seria muito grande.
Ainda assim e a pesar da China não ter um soldado ou uma base militar fora do suo territorio, a pressão politica ,economica e militar do governo Usa esta' aumentando (particularmente depois a eleição de Obama).Quiem quer a paz e acredita que e' justo e positivo pelo mundo inteiro que o devastador capitalismo americano possa ter um contrapeso forte a nivel global não pode não encarar com simpatia os successos economicos ,socias,politicos do mais popouloso pais do mundo.
Isto significa superar o duplo preconceito dos que a direita criticam a China porque' ainda e' governada por um partido comunista e a esquerda porque' a China valoriza o mercado e por isso seria "capitalista".
A China de hoje tem pouco a ver com os nossos sonhos ideologicos.Ela e' o resultado de um longo e dramatico processo historico que nas ultimas decadas consegiou pôr um quinto da humanidade no camino do progresso.Ainda tem grandes desafios na frente e o principal e' a reduçao das diferenças sociais e regionais que um desenvolvimento extremamente rapido esta determinando.
Mas a formula "socialismo de mercado" (programação a nivel macro e mercado a nivel micro) funcionana.E não tem governo no mundo (menos de todos os EEUU) que tem direito de dar aulas a' China. Sobre tudo quando as criticas e pressões tem com unico objetivo impedir que a China ocupe o suo devido lugar na comunidade internacional.
Antonio Fattore

O Manifesto